RIO — Com a ambiciosa meta de enviar 101 mil alunos ao exterior até 2015, o programa federal Ciência Sem Fronteiras (CSF) já impulsiona uma corrida inédita por testes de proficiência em línguas estrangeiras no Brasil, pré-requisito para estudar em universidades lá de fora. Como a habilidade com idiomas é uma das principais deficiências entre os candidatos, também está aquecida a procura por cursos de línguas.
O CSF foi iniciado no fim de 2011 e já concedeu bolsas de estudos a 22.474 alunos, todos de áreas científicas como engenharia e computação. O orçamento é de R$ 5 bilhões, dos quais R$ 3,2 bilhões vêm do governo federal e o restante, da iniciativa privada.
Apesar de caros e de serem aplicados várias vezes ao mês em todo o país, por causa demanda, está difícil marcar uma data em exames como Toefl, Ielts (ambos para inglês), Dalf (francês). Os cariocas que, por exemplo, tentaram fazer no início de janeiro o Toefl — que custa US$ 210 — só conseguiam vaga para março.
No curso Ibeu, a procura por aulas preparatórias cresceu mais de 20% em 2012, atingindo 400 alunos por semestre. Tanto que já surge demanda onde nunca houve, como nos bairros de Ilha do Governador, Recreio, Madureira e Campo Grande. A expectativa este ano é de um crescimento no mesmo patamar.
A afluência de tantos novos candidatos já transforma o perfil dos que buscam certificação. Regina Fendt, superintendente comercial do Ibeu, conta que a habilidade em inglês dos alunos que estão procurando os cursos é, na média, inferior ao que costumava ser. “Antes, os candidatos que nos procuravam já possuíam um nível muito bom na língua. Vinham de áreas que valorizam o inglês, como administração. Nas áreas de ciência, o inglês não é tão enfatizado”, analisou.
As empresas que elaboram os testes respondem à demanda abrindo novos locais de prova. A ETS, que faz oToefl, abriu 20 centros no ano passado, atingindo 93. A Universidade de Cambridge, que cria testes como Ielts e CAE, abriu três novos centros de aplicação, chegando a 73. “O CSF é, sim, um dos fatores que guiam nosso crescimento. Mas há também a explosão no número de pessoas aprendendo inglês no país. Além disso, cada vez mais empregadores escolhem o inglês como língua internacional”, disse Jennifer Brown, diretora-executiva do Toefl, acrescentando que o número de candidatos brasileiros subiu 34% em três anos.
Apesar da procura por cursos, brasileiros continuam perdendo bolsas por não dominar línguas. Não foi à toa que o governo brasileiro, a embaixada britânica e um grupo de universidades do Reino Unido reduziram a pontuação mínima exigida nos exames de proficiência. No Toefl, que vale 120 pontos, a nota aceitável passou de 72 para 42. Quem não conseguir nota suficiente terá que frequentar aulas de inglês lá no exterior.
O governo também lançou em dezembro o Inglês Sem Fronteiras, com cursos on-line e presenciais sobre a língua para candidatos ao CSF e universitários em geral. Um dos objetivos é realizar 500 mil exames do Toefl até 2014. O programa tem apoio da Embaixada dos EUA, que no ano passado ofereceu 125 bolsas de cursos preparatórios para exames no projeto English3, afirmou John Matel, diretor de Educação da missão americana. “Pensei que a procura seria bem maior, mas só conheço dois veteranos e dois colegas de turma interessados. Na faculdade, suspeitamos que o inglês é um obstáculo. Por isso a maioria busca bolsa para Portugal” contou Vinícius Landeira, de 20 anos, que frequentou aulas no Ibeu com bolsa do English3.
Portugal e Espanha já receberam, juntos, 4.716 bolsistas do CSF, enquanto o maior polo universitário do mundo, os EUA, recebeu 4.282. Estudante do 4º período de Engenharia Elétrica da UFRJ, Landeira buscava intercâmbio nos EUA por meio do CSF e só não conseguiu porque a greve do ano passado atrasou sua mudança de período. “Queria mesmo ter uma experiência lá fora. Meu inglês é intermediário, mas como assisto a muitos filmes e jogo videogames em inglês, acabo tendo uma boa compreensão. A dificuldade mesmo era falar, e por isso fiz as aulas”, afirma Landeira, que obteve 87 pontos no Toefl.
Além do CFS, eventos esportivos e economia motivam crescimento. No Cultura Inglesa, soma-se ao impacto do CSF a influencia de eventos como Copa e Olimpíadas. “Há demanda de associações e empresas para capacitar profissionais para esses eventos. A iniciativa dificilmente vem do funcionário, mas das empresas”, informou a diretora superintendente do Cultura, Maria LuciaWillemsens.
A elevação do custo de vida nas metrópoles brasileiras também é um dos fatores, na avaliação de Marta Bidoli, orientadora educacional no Alumni, um dos maiores de São Paulo: “As famílias estão fazendo as contas e percebendo que enviar o filho para estudar no exterior custa quase a mesma coisa do que mantê-lo aqui. Sobretudo se a família é do interior e a universidade fica em Rio ou São Paulo. Com a diferença de que ele vai retornar com experiência internacional”.
Segundo Juliet Wilson, uma das diretoras do departamento de avaliação de inglês de Cambridge, a procura por seus exames cresceu 15% no Brasil em 2012. “O país sempre teve alto número de candidatos, mas agora o hábito se expande além da elite. Um número maior de brasileiros está percebendo o quanto é importante falar bem inglês para fazer parte da economia global”, informou.
Fonte: O Globo – 23/02/2013